Em uma noite fria de janeiro, em 1892, Edvard Munch caminhava pelas colinas de Ekeberg, em Oslo, quando foi tomado por uma sensação que mudaria sua vida — e o mundo da arte — para sempre. O céu estava tingido de vermelho e laranja, como se em chamas, e a paisagem vibrava com uma energia que ele só poderia descrever como um “grito da natureza”. Esse momento singular deu origem a uma das obras mais emblemáticas e misteriosas da história: O Grito.
O Surgimento de uma Obra Imortal
Criada pela primeira vez em 1893, a obra, conhecida por retratar uma figura central de rosto contorcido, mãos pressionando o rosto, e um céu que parece pulsar com emoção, não apenas capturou o sentimento pessoal de Munch, mas se tornou um símbolo universal de angústia. Curiosamente, “O Grito” não é apenas uma pintura. Munch produziu quatro versões dessa obra, utilizando técnicas variadas como óleo, pastel e litografia.
Duas das versões estão em exibição no Museu Munch, em Oslo; uma delas na Galeria Nacional da Noruega e outra pertence a uma coleção particular. Apesar das diferentes versões, todas elas compartilham a mesma essência: um grito existencial que ecoa através do tempo.
Um Silêncio Que Fala Alto
Um dos aspectos mais intrigantes de O Grito é que, apesar do título, a figura central pode não estar gritando. Muitos críticos e historiadores da arte sugerem que, em vez de emitir um grito, a personagem está ouvindo um grito — um som que vem de dentro ou do ambiente.
Essa dualidade é reforçada pelos escritos de Munch. Em seu diário, ele descreveu a experiência que inspirou a pintura:
“Estava andando por um caminho com dois amigos – o sol estava se pondo – de repente o céu ficou vermelho como sangue. Eu parei, exausto, e me apoiei em uma cerca. Havia sangue e línguas de fogo sobre o fiorde azul escuro e a cidade. Meus amigos continuaram, e eu fiquei lá tremendo de ansiedade — senti um grito infinito atravessando a natureza.”
A visão de Munch transcende a pintura, encapsulando uma profunda conexão entre o ser humano e o mundo ao seu redor.
“O Grito” na Cultura Popular
Ao longo das décadas, O Grito se tornou uma referência que transcende a arte tradicional. Sua influência é vista em filmes, séries e até memes. Quem não reconhece a máscara icônica da franquia Pânico, inspirada diretamente no rosto contorcido da figura de Munch?
Além disso, a obra foi alvo de dois roubos notórios. Em 1994, uma das versões foi retirada da Galeria Nacional da Noruega, durante a abertura dos Jogos Olímpicos de Inverno em Lillehammer. Em 2004, uma versão foi roubada do Museu Munch em Oslo. Em ambos os casos, as peças foram recuperadas, mas não sem danos, o que aumentou ainda mais a mística em torno da obra.
Uma Jornada Interior
A beleza de O Grito está em sua capacidade de ser universal. Ele reflete uma emoção que todos já experimentaram: medo, ansiedade, solidão ou a sensação de estar à beira do desconhecido. A figura central, com sua forma indefinida e expressão exagerada, não representa um indivíduo específico, mas todos nós. Munch conseguiu capturar uma emoção crua e, ao mesmo tempo, profundamente complexa.
O céu vermelho, quase apocalíptico, e a paisagem ondulante parecem estar em sintonia com o estado emocional da figura. É uma fusão perfeita entre o interno e o externo, um eco visual que transcende palavras.
Um Símbolo Atemporal
Mais de um século depois, O Grito ainda é estudado, debatido e celebrado. É uma obra que ressoa com pessoas de diferentes culturas e gerações, pois toca em algo profundamente humano. Munch, ao expressar sua própria vulnerabilidade, criou um espelho no qual todos podemos nos enxergar.
A obra nos lembra que, em meio ao caos e às incertezas do mundo, às vezes tudo o que podemos fazer é parar e ouvir — ouvir o grito que vem da natureza, de nosso interior, ou talvez, do próprio universo.
É isso que faz de O Grito uma obra tão poderosa e eterna.